O espelho de Sofia
Eu não entendo nada de moda, isso explica porque estou (quase) sempre mal vestido. No entanto, atualmente pouco importa se você ‘entende’ de algum assunto para emitir opinião, o que vale é falar. No meu caso, escrever.
Ademais, não trato de moda, sim de estilo, na melhor acepção da palavra, estilo comportamento, estilo adequação, estilo autenticidade. E disso eu penso que entendo, embora me pareça mais com um isopor de cerveja que com o Robert Redford.
Daí que de uns tempos para cá ando encucado com uma onda avassaladora que tomou os rostos das mulheres cariocas – certamente começou em Nova Iorque foi se espraiando pelo mundo até cruzar o Equador e aportar em Copa: Os tais óculos escuros de formato grande, quadrado, lentes dégradé, que costumo chamar de óculos escuros tipo Sofia Loren.
Nada contra a eterna musa do cinema (pelo contrário), é que tenho a impressão de sempre cruzar com a atriz pelas ruas. Caminhando no calçadão, flanando pelo Centro, no supermercado, nos bares... só vejo Sofias. Todas ficam a cara de Sofia quando enfiam os tais óculos na cara. Que mal há nisso? Perguntam meus amigos. O mundo não fica mais bonito quando todas as mulheres se parecem com a Bella Donna? É, pode ser, mas a questão não é beleza, é repetição, falta de diferença, isso deixa até mesmo a Sofia Loren desinteressante. E essa redundância crônica da cena contemporânea tem deixado o mundo sem graça.
Afora a onda vintage que reina soberana e sobre a qual não pretendo redigir um único pingo em i, é a necessidade de se parecer com todo mundo, de se auto-iconizar (ou pelo menos buscá-lo), de mostrar que está in, o que leva as pessoas a cobrir as pestanas com esses óculos.
Céus, a graça da humanidade reside, ou nasce da diferença. Verdadeiros ícones foram diferentes em tudo, romperam estilos, estigmas, marcas; inovaram; criaram a partir da ousadia. Nenhum deles admitiu ser igual ao que veio antes e, precisamente por isso, se tornaram símbolos, inventores do seu próprio estilo. Nada a ver com vestir paletó laranja e calça marrom, adornada por um All Star quadriculado, mas justamente baseados em uma sensibilidade inata, foram capazes de sentir e fazer, não fazer para se sentir.
Não faltam grandes exemplos como Bob Dylan e Jim Morrison, Fernando Pamplona e Joãosinho Trinta ou, para brincar com a moda, Coco Chanel. Na medida do verossímil, não imagino encontrar Madame Chanel vestindo algo que tenha sido ‘imortalizado’ pela Beyonce, ou que tenha sido utilizado no catálogo do figurino da última novela das nove, menos pelo status, que pelo próprio comportamento corajoso de ser o que era, não o que esperavam que fosse.
Taí, talvez seja essa a explicação para que (quase) todas as garotas cariocas de hoje se assemelhem ao reflexo opaco do espelho de Sofia, deve ser o medo (falta de coragem) intrínseco de mostrar quem são.
A continuar desse jeito, periga o próximo Jim Morrison usar cabelo boi lambeu, camiseta Tommy e compor sertanejo.
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