quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Esconjuro, pé de pato, mangalô três vezes.




O fim do ano se aproxima e os assuntos são sempre os mesmos: amor, fraternidade, peru, expectativas para o que vem pela frente, aquela velha história do ciclo que se fecha e renova, roupa branca, chuva na virada do ano. Esse ano teve a novidade do fim do mundo, que ocupou um tanto de páginas por aí, o que foi divertido – pelo menos eu me diverti. Minha contribuição para os assuntos recorrentes é falar sobre superstição.

Cresci numa família cristã (bastante) conservadora. Lembro-me da reprimenda que levei do meu pai quando contei que lia, regularmente, o horóscopo no final do jornal. Nunca acreditei em astrologia, mas achava engraçado ler os conselhos clichês, ou mesmo aqueles jogos de perguntas que indicavam que o leitor teria sido um guerreiro celta, ou uma princesa na idade média, encarnações antes. Mas isso era uma blasfêmia.

Já, no campo das superstições, meu pai era craque. Eu, aluno fiel. Para longe da hipocrisia, o quadro é a reprodução fiel do brasileiro sincretizado, que tem suas crenças e rejeita outras – embora superstição não seja exatamente uma crença. E, quando se vê encurralado, acaba acusando o golpe e admitindo a culpa. Tanto que, certa vez, ao evitar passar por baixo de uma escada na Avenida Rio Branco e quebrar o pé, o velho disse diante do meu sorriso, “Não falei que essa porra de superstição é blasfêmia?”

Não adiantou o exemplo doloroso, mantenho as minhas até hoje. Não ligo para a cor da roupa no dia da virada, nem pra comida da ceia, por que não ligo para o réveillon. Infelizmente minhas crendices se manifestam em coisas mais sérias.

Por exemplo, esse ano assisti a todos os jogos do Flamengo na companhia de uma imagem decapitada de São Judas Tadeu. Pois é, por conta de um acidente doméstico, São Judas perdeu a cabeça. Talvez isso explique as terríveis campanhas do time. Prometi a minha mulher que ano que vem, ou colo a cabeça do santo, ou compro outra imagem.

Por falar em minha mulher e futebol, ela mesma tem suas manias, como permanecer na mesma posição em que estava quando o Flamengo fez o gol. Isso pode ser complicado, acredite em mim.

No campo profissional, nunca conto a ninguém quando estou tendo sucesso, ou quando as coisas vão mal. Não tem nada a ver com manter segredo previdente, é crendice mesmo. Se me perguntam como vão as coisas no trabalho, respondo, há 12 anos, que estão bem, e nem sempre estiveram.

Não gosto de jogar tênis de meias curtas, mas meu jogo não melhora quando coloco meias compridas. Não pego elevadores que demoram muito, mas nunca soube de algum que tenha despencado depois que desisti de entrar. Ou seja, superstição é mesmo uma tolice.

No próximo dia 31 um exército vestido de branco invadirá Copacabana, pularão sete ondas, atirarão caroços de uvas nos telhados, comerão lentilha (bicho que cisca pra trás, jamais), estourarão champanha, ou não, e tudo será igual no dia seguinte, ou não.

A graça da superstição não está no resultado, está na situação em si. Na loucura lúdica, no medo infantil que leva um sujeito de sessenta anos a desviar de uma escada e quebrar o pé, e se encerra ali. É quase um TOC – às vezes se transforma mesmo em obsessão.

Ou será que você acredita mesmo que vai resolver seu problema amoroso se passar o ano de cueca vermelha. Bom, você pode até crer nisso, mas antes de vestir essa peça constrangedora, dê uma olhada no espelho, escove o dente e reveja a lista de amigos. Vai que você é feio, tem mau hálito e é chato. Nesse caso, meu caro, eu garanto, não tem cueca que salve.


trilha dos supersticiosos:






domingo, 16 de dezembro de 2012

É hora de dar tchau





Tem uma coisa de Teletubbies nessa zoeira de fim de mundo programado que me agrada. Seria bom se sempre soubéssemos a data exata do fim. Do fim de qualquer coisa.

Preocupa (será?) a possibilidade de na próxima sexta-feira o mundo seguir adiante, mas um bando de malucos sair matando gente por aí, sair engravidando, sair se endividando. Por mais que pensem ser exagero, pode crer, o sábado promete as manchetes mais toscas do milênio. E é disso que eu estava falando no parágrafo anterior, isso que me agrada.

Pensando como loucos, ou irresponsáveis, as pessoas acabam vivendo como deveriam viver. Bom, não sei se como deveriam viver, mas vivem melhor, sem grandes planos, que as coisas boas acontecem quase sempre naturalmente.

Não quero fazer apologia do descompromisso, viver sem grandes planos não significa ser irresponsável. É que eu vejo as pessoas gastando tanto tempo com os planos, pensando no que vai ser quando chegar ao objetivo, que não aproveitam todo o resto, que é na verdade a vida.

E aí, vem de novo aquela ideia do fim do mundo programado, todo mundo fazendo o que der na telha (soube de um caso verdadeiro de empréstimo vultoso fiado no apocalipse), aquilo que reprimia por conveniência ou insegurança, e que explode apoiado na única certeza da semana: o mundo vai acabar.

Ora bolas, a única certeza que temos desde que levamos a palmada na maternidade é a de que o mundo, um dia, vai acabar para nós. Vá lá, talvez seja a novidade do fim coletivo, não vou sozinho, vamos todos lotar o barco. Mas, no fim não faz diferença, um dia ele acaba mesmo, e nós gastamos o tempo sem pensar nisso, fazendo grandes planos, sonhando.

Pense, então, na possibilidade de saber a data exata do término de um namoro, da morte da sua mãe, do dia em que você vai ficar rico, ou pobre. Pense em como seria sua vida se você soubesse o dia exato em que coisas sobre as quais você não tem controle vão acabar, ou começar, ou acontecer. Nas coisas incríveis que faria, no tempo que passaria ao lado da pessoa, no valor que daria a cada momento.

Essa deveria ser sua vida normal.

Não é fácil, eu também não sou assim, e acho que não passarei a ser se o mundo continuar a girar no sábado. Na verdade, essa crônica foi só uma maneira de gastar o tempo fazendo o que mais gosto, vai que...



Minha música favorita de fim de mundo: it´s the end of the world as we know it - R.E.M.